setembro 5, 2014 Deixe um comentário
Correio do Brasil
Em meio à polêmica por causa da falta de explicação para a compra ou uso do jatinho que, na queda, matou o líder da coligação PSB/Rede Sustentabilidade, Eduardo Campos, a campanha da ex-senadora Marina Silva agora se vê de frente a um novo obstáculo, ainda mais grave, que é o apoio aos torturadores que mataram presos políticos nos porões da ditadura militar. Marinarecebeu, de braços abertos, a torcida do Clube Militar, formado por oficiais da reserva, de perfil ultraconservador. No manifesto Pensamento do Clube Militar — Um fio de esperança, divulgado na quarta-feira, a candidata do PSB é apontada como a “esperança de algo novo e diferente, que rompa com a tradição negativa representada pelos atuais homens públicos”.
General da reserva e autor do panfleto radical, Clóvis Purper Bandeira explicou a jornalistas, nesta sexta-feira, que Marina é “a grande aposta dos militares para derrotar o PT”. O general afirmou que, embora tenha começado a carreira política e se elegido sempre pelo PT, Marina representa mudanças. O Clube Militar, afirma Bandeira, considera prioritárias a melhoria dos salários nos quartéis, a revisão do papel do ministro da Defesa, permitindo que o cargo seja ocupado por um oficial, e a preservação da Lei da Anistia, evitando que os agentes do regime militar (1964-1985) sejam punidos, enquanto os ex-militantes das organizações da esquerda armada permaneçam impunes.
No texto, os representantes da ultradireita lembram que, com 20 milhões de votos nas últimas eleições presidenciais, em 2010, Marina é “séria pretendente ao cargo nas próximas eleições”. A candidata, segundo os militares, segue empatada com a presidente Dilma Rousseff (PT) no primeiro turno e venceria no segundo com uma folgada diferença, como indicam as pesquisas mais recentes, por ter incorporado o “desejo vago de mudanças que levou o povo às ruas em junho do ano passado”.
Não bastasse o apoio dos defensores dos Anos de Chumbo, a campanha de Marina Silva precisará agora responder como ocorreu a transferência de recursos para a comprar do avião Cessna, que caiu no mês passado, por uma empresa que também fez negócios com a consultoria de fachada que seria controlada pelo doleiro Alberto Youssef, preso na Operação Lava Jato. Segundo o diário conservador paulistano Folha de S. Paulo, a firma Câmara & Vasconcelos consta como tendo feito um pagamento de R$ 159,9 mil à AF Andrade para a aquisição do avião Cessna. Segundo a Polícia Federal, a Câmara & Vasconcelos também aparece em documentos daOperação Lava Jato na relação de fornecedores que receberam dinheiro da MO Consultoria. Segundo o jornal, o depósito foi feito em 2010, no valor de R$ 100 mil.
Contraponto
Enquanto os militares radicais levam o apoio à Marina Silva, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, em sentido oposto, divulgaram nesta sexta-feira a Carta do MST aos candidatos e candidatas à Presidência da República. No documento, o movimento social lembra que “os períodos eleitorais devem ser momentos de debate sobre as grandes questões estruturais da sociedade brasileira, apontando a natureza de nossos problemas e as soluções necessárias. Infelizmente, cada vez mais, o poder do capital sequestra a política e as instituições públicas, impedindo as transformações políticas e econômicas que interessam ao povo brasileiro”.
“Há 30 anos, o MST tem contribuído com a democratização da terra, através da luta pela Reforma Agrária. Em fevereiro de 2014, realizamos nosso VI Congresso, com a aprovação de nosso Programa Agrário em defesa da Reforma Agrária Popular. Lutamos por mudanças na relação com os bens da natureza, na produção de alimentos e nas relações sociais no cam¬po. Queremos contribuir de forma permanente na construção de uma sociedade justa, igualitária e democrática”, afirma o documento.
Leia, a seguir, os principais pontos do manifesto:
A terra precisa ser democratizada e cumprir com sua função social. O campo dever ser um espaço bom de viver, onde as pessoas tenham seus direitos respeitados, com a garantia de condições dignas de vida. Lutamos e exigimos uma política efetiva, estruturante e massiva de Reforma Agrária Popular, indispensável para a permanência das famílias no campo, com produção e distribuição de riquezas.
Exigimos a atualização imediata dos índices de produtividade prevista na legislação brasileira, possibilitando o acesso à terra a milhares de famílias. Precisamos da elaboração e execução de um novo Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA), com metas de assentamento de famílias e estabelecimento de prioridades por regiões.
É necessário a arrecadação das terras griladas da União e a desapropriação de latifúndios em todos os estados. Além disso, as terras devolutas invadidas, principalmente, pelo capital bancário e pelas empresas transnacionais do agronegócio, devem ser desapropriadas para fins de Reforma Agrária.
O mesmo deve acontecer com as fazendas endividadas com os bancos públicos e órgãos do governo, com as áreas onde houver identificação com exploração de trabalho escravo e as que não cumprem a função social.
Cobramos o assentamento imediato das mais de 120 mil famílias que estão vivendo em condições precárias em centenas de acampamentos por todo o país. É necessário destinar para a Reforma Agrária as terras dos projetos de irrigação e as do entorno dos canais de transposição das águas.
Para isso, faz-se necessário o fortalecimento, reorganização e qualificação do INCRA, como órgão responsável pela Reforma Agrária e que garanta as condições de implementá-la.
Nos somamos às lutas e às reivindicações, junto às demais forças sociais do campo, para a imediata demarcação e legalização de todas as áreas indígenas e quilombolas e as de posse de ribeirinhos, pescadores e comunidades tradicionais, como estabelece a Constituição Federal de 1988.
A não realização da Reforma Agrária agrava os conflitos sociais no campo. Clamamos por justiça e pela punição aos mandantes e assassinos dos trabalhadores e trabalhadoras no campo.
A agricultura brasileira deve priorizar a produção de alimentos saudáveis, como um direito humano e como princípio da Soberania Alimentar. Alimento não pode ser mercadoria, fonte de exploração, lucro e especulação.
Para isso, exigimos políticas públicas que garantam condições para a produção agroecológica, sem agrotóxicos, com qualidade, diversidade e preço barato para toda a população brasileira.
Os governos federal e estaduais precisam incentivar e garantir a produção, seleção e armazenamento de sementes pelos próprios camponeses, combatendo assim as sementes transgênicas e a dependência política e econômica das empresas transnacionais que monopolizam sua produção e comercialização. Somos contra as leis de patentes e a privatização de nossas sementes.
É indispensável, para o desenvolvimento social e econômico do campo, retomar, ampliar e garantir os instrumentos de compra de todos os alimentos produzidos pela agricultura camponesa, para atender escolas, sistema de saúde, de segurança e universidades, a exemplo do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
A educação é um direito fundamental de todas as pessoas e deve ser atendido no próprio lugar onde vivem, respeitando o conjunto de suas necessidades humanas, culturais e sociais. Necessitamos que todas as áreas de assentamentos e acampamentos tenham sua própria escola, com condições necessárias para o seu funcionamento.
Não aceitamos o fechamento de nenhuma escola do campo e exigimos a implementação de um programa massivo de erradicação do analfabetismo. Lutamos pela defesa, universalização, ampliação de recursos e o acesso efetivo ao Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), garantindo que jovens e adultos, que vivem no campo, possam avançar na escolarização.
O assentamento é nosso território de luta, produção, reprodução e garantia de nossa vida, lugar de defesa e construção de um modelo de agricultura, com a produção de alimentos saudáveis e acesso aos bens sociais e culturais. Para isso, é necessário assegurar condições dignas de vida às populações camponesas e urbanas, produzindo uma nova sociabilidade.
Exigimos políticas de proteção dos bens naturais, das águas e fontes, assegurando que todas as famílias camponesas tenham acesso à água potável e de qualidade, com saneamento básico. Repudiamos o processo de privatização da água.
Lutamos pela implementação de um programa de moradia popular no campo, que garanta o seu acesso de forma rápida e desburocratizada, eliminando o déficit atual de mais de 1 milhão de casas para a população camponesa.
Reivindicamos a ampliação e execução de um programa de agroindustrialização nas áreas de Reforma Agrária, a partir das cooperativas de trabalhadores e trabalhadoras, de forma desburocratizada.
É preciso assegurar o desenvolvimento de tecnologias apropriadas à realidade das comunidades camponesas com o desenvolvimento de programas de máquinas e equipamentos agrícolas.
É urgente a reorganização e fortalecimento do sistema público de Assistência Técnica e Extensão Rural, voltado e subordinado às necessidades e objetivos dos camponeses e das camponesas.
A ele deve somar-se um programa de crédito rural que contribua para a estruturação do conjunto de todas as unidades e sistemas produtivos, estimulando e fortalecendo o cooperativismo, a comercialização e a industrialização da produção.
Exigimos a garantia e ampliação dos direitos trabalhistas e previdenciários aos trabalhadores e trabalhadoras do campo e assalariados rurais.
É necessário o compromisso de todos e de todas para a realização de uma ampla Reforma Política, que democratize as instituições e possibilite ao povo o direito de escolher seus representantes. E para isso exigimos a convocação de uma Assembleia Constituinte soberana e exclusiva, ainda em 2015.
São essas algumas das mudanças urgentes e necessárias, para melhorar as condições de vida e de renda no campo, que todos os governantes eleitos devem implementar. Reafirmamos nossa disposição em lutar, de forma permanente, em defesa e na construção da Reforma Agrária Popular e de uma sociedade socialista.